Quem se mantém “agarrado”, normalmente está mal. Na realidade, precisa de terapia para se livrar do veneno. Mas nem todas as pessoas dependentes querem decidir-se por uma desintoxicação e consequente terapia: nem no caso da heroína, nem do álcool e muito menos no caso do fumo, independentemente do que se fume. Muitos cuidam das suas dependências e vivem bem com elas, pelo menos é o que eles dizem.
Algo muito semelhante acontece com a nossa economia, que se estabeleceu na sua dependência. A nossa economia está dependente de subvenções, sobretudo num dos seus sectores. Todo o veneno de Bruxelas e de Lisboa é injectado No turismo. O FMI afirma agora que Portugal depende demasiado do sector dos serviços, e, não conseguindo mais alimentar-se a si próprio, teria que importar demasiado, exportaria muito pouco, teria uma gestão pomposa e ineficiente. E caso entrássemos numa outra crise financeira num futuro próximo – por exemplo no sector da energia – com uma potencial subida dos preços dos combustíveis; um imposto verde para aviação e suas emissões; ou no caso de outra erupção vulcânica numa ilha – o turismo em Portugal poderia entrar em colapso. E quanto aos terramotos à porta da própria casa, até então os especialistas ainda não refectiram.
O que aconteceria se amanhã significativamente menos turistas entrassem no país através dos aeroportos portugueses; e ainda se os hotéis, apartamentos turísticos e restaurantes vazios disponibilizassem ainda mais espaços de habitação inutilizados? Mais de dois milhões de desempregados fazem fila de pé nos balcões dos centros de emprego, para novamente requerem subvenções: o subsídio de desemprego.
O conceito de resiliência nasceu da necessidade e ainda não chegou a Portugal
O conceito de resiliência nasceu da necessidade e ainda não chegou a Portugal. Descreve a tolerância, ou melhor, a capacidade de resistência de um sistema contra perturbações. Como faço para lidar com mudanças numa situação habitual? Neste sentido, pelo menos uma vez na vida devemos refletir sobre a questão: o que aconteceria a Portugal amanhã, se todas as subvenções destinadas aos nossos projectos turísticos fossem suprimidas; se não fosse mais incentivada a construção de hotéis, também porque já afectaram demais a vista aberta para o mar. Imaginemos que não seria promovido mais nenhum projecto na área do turismo, e talvez também mais nenhum megaprojeto de agricultura e silvicultura industrial (suinicultura e avicultura, florestas de eucaliptos, etc.).
Como um país poderia desenvolver-se, se em princípio, houvesse uma reconsideração e redefinição da atribuição de fundos? Dando prioridade a futuros projectos ecologicamente sustentáveis, nas áreas da formação e tecnologia, do sector da saúde, habitação pública e privada, eficiência energética dos edifícios, agricultura biológica e geração de energias alternativas, e isto apenas no âmbito local através de entidades promotoras locais, como por exemplo, através de uma agência de financiamento do menor decisor à escala local.
Refira-se que nos últimos 25 anos de pertença de Portugal à UE, praticamente foram promovidos apenas os projectos errados com os meios errados, e Portugal e a sua economia chegaram a um impasse de um beco sem saída do qual dificilmente se consegue sair. Mas como imaginaríamos uma promoção regional ecologicamente sustentável? Quais seriam as alternativas?
Saíamos de uma pequena comunidade, e em Portugal teríamos muito, para ser exacto, 308 concelhos no total. Numa zona rural, como por exemplo Monchique, onde dos seus 397 quilómetros quadrados de área, 75 por cento são floresta industrial de eucaliptos, os riscos de incêndios florestais, assim como de erosão dos solos, poderiam ser enormemente reduzidos com uma política cuidadosa e prudente, em que uma autarquia local promoveria, com diligência e com poucas ajudas, os produtos locais como por exemplo, azeitonas, castanhas, cortiça, cerejas, alfarroba, maçãs, batatas, cogumelos, etc., de um modo ecologicamente sustentável. Com um orçamento de menos de 1 milhão de euros – caso fosse dado a cada pequeno agricultor um incentivo de apenas €0,10 por quilograma dos seus produtos – poderiam ser colhidos anualmente pelo menos 10 mil toneladas de produtos locais, que seriam transformadas em azeite, farinha de alfarroba, materiais de isolamento na construção de habitação, etc. No centro de tal política estaria, em primeiro lugar, a autossuficiência e além disso o conceito de resiliência.
Como uma aldeia pode lá chegar, podemos observar pelo exemplo do concelho de Totnes, em Inglaterra. Uma vez enormemente endividado, mas munido de vontade política e da motivação para a agricultura tradicional e biológica, bem como para a produção de energias mais modernas e eficientes de cariz renovável, Totnes, no ano 2006, deu início a um processo irreversível para uma vida melhor para os seus habitantes. Já em 1982, o filósofo americano Fritjof Capra no seu bestseller mundial “O Ponto de Mutação”, descrevia a mudança de paradigma que se aproximava no nosso actual novo século. Iria ocorrer uma mudança, em que a visão mecânica do mundo de um Descartes do século XVII resultaria numa nova abordagem holística e ecológica.
Vemos com emoção actualmente a pobreza das nossas cidades (Portimão, por exemplo), onde cada vez mais pessoas fogem do campo, deixando-o para trás abandonado. As suas capacidades artesanais e agrícolas, de se alimentarem a si próprias, desaparecem visivelmente junto com o endividamento.
No futuro seremos cada vez mais forçados a enfrentar adequadamente o inesperado e a saber gerir juntos solidariamente: as intempéries, bem como o Alzheimer e Ébola, a escassez de água, a fome, o desemprego e milhões de refugiados de territórios inabitáveis, bem como uma possível forte recessão do turismo.
Depois, nós apenas iremos sobreviver económica e ecologicamente, e ter uma vida melhor, se estivermos atentos e aprendermos a compreender a sustentabilidade e focarmos nisso o nosso quotidiano. José Garrancho, João Gonçalves e Hugo Lopes foram em busca de respostas, que poderá ler nas próximas páginas.