Sábado, 25 de Julho de 2020
Gerir a política local é uma arte. Até é uma disciplina universitária. Mas isso não garante que se apliquem medidas políticas boas. No fundo, não basta ter talento, há que se sincero, cuidar, e ter carácter suficiente para tomar decisões sustentáveis de forma independente. Decisões que sejam úteis para o futuro de uma aldeia ou de uma cidade. A arte da política dá frutos quando consegue fazer crescer a riqueza de uma região. Quando um presidente de câmara tem que abdicar de se recandidatar depois de três mandatos, para se reformar, e recebe uma reforma vitalícia, passando a ser mero espetador, o Estado deveria ser próspero diante das medidas que tomou, sem vítimas ao abandono sobre terras queimadas.
Ter atitude e pensar com clareza reverte em muitas vantagens para um político. O autocontrolo facilita o sucesso. Há cientistas que afirmam até que estas características nos políticos são mais importantes do que a inteligência. Quem é esperto, mas chega atrasado está a desperdiçar o seu talento. Conheço um político local com quem tive 29 reuniões agendadas em dez anos. Não houve uma única vez que tivesse chegado a horas. Depois, deixei de marcar reuniões com o mesmo. As pessoas com um autocontrolo saudável, para além do mesmo, têm a capacidade de manter relações estáveis, organizam as finanças pessoais e da comarca de forma sólida e normalmente fazem por estar fisicamente e mentalmente saudáveis. Por outro lado, a falta de disciplina e de sensibilidade podem gerar comportamentos agressivos ou culminar no uso de estupefacientes – o que não é propício para a carreira e a vida pessoal.
Um bom político toma as decisões certas no momento certo. Este político que chega sempre atrasado acabou de tomar uma decisão que poderá um dia custar-lhe caro. De qualquer forma, desrespeita as vítimas dos incêndios. Aceitou uma prenda do fornecedor de energia que está a ser investigado pela Polícia Judiciária por ter, alegadamente, com a sua postura negligente, provocado um incêndio. A prenda é uma trituradora industrial no valor de 50.000 euros. Aceitou esta prenda sabendo que “não há almoços grátis.” O leitor com certeza que conhece esta expressão que envolve a expetativa de receber algo em troca. Um político não pode, de forma alguma, permitir que os seus atos sejam condicionados dessa forma.
Claro que são necessárias trituradoras no concelho, e muito mais do que uma. Para toda a área de 400 km² seriam precisos doze a 15 máquinas para transformar os resíduos da silvicultura em “mulch”. A comarca deveria disponibilizar máquinas desse tipo para evitar que se façam queimadas ou que se deixem esses resíduos na floresta. Seria uma boa medida para mitigar as emissões de CO2, reduzindo as queimadas, o risco de incêndio e a perda de humidade do solo. Sem dúvida que faz sentido o uso de destroçadores.
Mas a questão fundamental aqui é se um político pode aceitar uma prenda de uma entidade que está a ser investigada judicialmente. O fornecedor de energia elétrica, neste caso, poderá ser condenado a pagar pelos danos em mais de 70 casas ardidas, um processo que provavelmente se irá arrastar. A comarca, ela própria, representada pelo seu presidente de câmara, teria direito a indemnizações neste processo.
São mais de 1,8 milhões de euros de danos em infraestruturas e sinais de trânsito. A autarquia poderia – e deveria – ser uma das partes reclamantes a assistir neste processo. Por que razão é que este presidente de câmara estará a comprometer a sua integridade aceitando esta prenda envenenada? A política é uma arte. Quando há favores deste género a corrupção já não anda longe. Pergunta chave: A que concelho e a que presidente me estou a referir?