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Joaquim Carneiro - mestre da terra

Uma vida com o mar no horizonte

O mestre de terra Joaquim Carneiro recebeu a ECO123 no armazém onde pratica a sua profissão, nas instalações da Docapesca (1), no rio Arade e próximo da vila do Parchal (concelho de Lagoa). Prestes a fazer 84 anos, mestre Joaquim continua a trabalhar diariamente, sentado entre quilómetros de rede de pesca que remenda ou ‘arma’ com uma destreza e vigor invejáveis. O seu discurso frequentemente inflama-se com a paixão de quem ainda defende ideias e acredita num futuro melhor. Como quando defende a prática indispensável do defeso para proteger as espécies ou critica o recurso ao turismo como actividade principal da região, acompanhada da destruição da frota pesqueira e da indústria conserveira. Mas também, por vezes, surge com a serenidade que a sua idade lhe permite ter, perante um futuro em que os mestres de terra poderão desaparecer. Mesmo aí, afirma com um sorriso triste, “a actividade não vai parar. Ninguém é insubstituível, o mundo não pára”.

ECO123: Quando começou a aprender a sua profissão?
Joaquim Carneiro: Em 1942, tinha doze para treze anos.

Actualmente, no que consiste a profissão de Mestre de Terra?
 Joaquim Carneiro Uma arte de cerco é composta de várias peças, que nós chamamos cabos de rede. Esses cabos de rede são ligados uns aos outros, malha a malha, no que chamamos os ‘porfios’ (derivado de porfiar). Cuja arte faz uma circunferência de cerca de oitocentos metros. Temos então o armar da rede, que consiste em colocar as bóias que ficam acima da água por cima e o chumbo em baixo. E isso também tem saber, porque a rede tem determinada largura mas as extremidades têm que ficar mais curtas, para formar bolso. E portanto é preciso dar uma folga à rede.
Por isso a actividade do Mestre de Terra não é só saber remendar a rede, também tem que conhecer o pormenor de a armar – é o principal.
E até mesmo o remendar da rede, tem o ‘pegar’: a rede está partida, tem milhares de malhas e temos de saber fazer com que as pontas a remendar batam certo entre si. É preciso esse saber também, o ‘pegar’ a rede.

Há pessoas a aprender esta profissão?
Do tempo em que fui aprender só resto eu e um outro mestre de terra, o mestre António, em Alvor. E antigamente éramos 70 ou 80 em Portimão. A pesca foi-se reduzindo de tal maneira que já não dá possibilidades nenhumas da juventude se dedicar à actividade. Aprender isto não interessa, a juventude não tem perspectivas nenhumas nisto.

O que sucederá quando se reformarem?
Uma vez estava a remendar a rede e apareceu o mestre Joaquim, da Arrifana, também dono de uma traineira, que me disse: “Ó mestre Joaquim, isso já não se remenda rede, homem! Porfia-se e quando já não der, compra-se novo.” Quando um mestre e dono de um barco diz isso, está a ver como isto está? É conforme as possibilidades económicas de cada empresa. O que eu faço aqui é aproveitar a rede que está em melhores condições. A que já não serve, vai fora. Às vezes há bocados em melhores condições que cortamos aos bocados e emenda-se com eles. Noutros casos, quem tem mais possibilidades, manda vir novo.

(1) ‘Mestre de terra’ is a Portuguese expression meaning literally ‘master of the land’ – he is responsbile for maintaining and repairing the fishing nets.
(2) www.docapesca.pt/pt/rede-de-lotas/lotas/ item/portimao.html

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