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1ª Parte – Uma árvore precisa de tempo para crescer
2ª Parte – Entrevista com José Chaparro CDS-PP com Podcast

Nº 100 –
1ª Parte – Uma árvore precisa de tempo para crescer
2ª Parte – Entrevista com José Chaparro CDS-PP com Podcast

Sábado, dia 14 de agosto de 2021

Temos o dever de nos preocupar em conciliar concretamente a ecologia e a economia? Os incêndios florestais são horríveis, mas as áreas ardidas, depois de superado o choque e o trauma, também significam uma enorme segunda oportunidade. Uma floresta diversa leva muito tempo a crescer, mas é muito importante. Muitas das florestas vítimas do calor e do fogo nos últimos anos resultaram da ideia de floresta como fator comercial para gerar lucros rápidos. É algo que está a mudar, quer a indústria queira ou não. As boas notícias são: em Monchique, monoculturas de eucalipto começam a ser substituídas por florestas diversas. Começa a haver silvicultores que reconhecem que na floresta não se aplicam as leis da economia de mercado. Em muitos países do Sul da Europa, assistimos ao que acontece quando nos deixamos levar pela ganância e pela ignorância. Arde tudo. Pretendia-se criar muita madeira, de forma rápida. Madeira para a construção, para queimar e para a produção de papel. O eucalipto e o pinheiro eram as espécies mais promissoras para os proveitos rápidos e, por isso, foram plantados em larga escala. Durante as duas últimas gerações, ninguém se preocupou com a gestão da água, a sustentabilidade e a resiliência, e muito menos com o aquecimento global.

As plantações novas com espécies mais resistentes, em diversidade, só ficam visíveis depois de várias décadas. Mas quem quiser criar uma floresta robusta e sustentável e tiver como intenção travar os incêndios, não poderá ignorar essa transformação – abandonando as plantações em monocultura de larga escala para ir ao encontro de florestas diversas e sustentáveis. Assim, defendem-se os interesses de quem irá herdar as florestas e terá que as tratar, em oposição aos produtores de papel, que na floresta só vêm uma fonte de recursos. Uma floresta também merece ter a sua beleza.

Portanto, a floresta tem que ser completamente alterada e voltar a ser um espaço natural. Porque menos monoculturas (acácia e eucalipto) a destruir o lençol freático significam um retorno do equilíbrio natural na gestão da água na natureza. O objetivo da redução dos incêndios é prioritário. É para isso que precisamos de mais floresta com espécies de folha caduca e mais diversidade. Cada vez mais vozes defendem essa exigência. Os objetivos do novo “Green Deal” são agora uma oportunidade única para tornar a floresta mais resiliente no futuro e receber para esta transformação apoios. Uma floresta que, no Sul da Europa, há já muitos séculos não é virgem.

Tudo aponta para que seja vantajoso substituir a vertente comercial pela proteção natural da floresta em grande parte das áreas de Portugal (e também da Grécia, de Itália, de Espanha). Todo o silvicultor deve ponderar bem a forma de substituir o eucalipto: por exemplo, pela produção de energia limpa, que tem muita procura e apoios. Que tal substituir dez por cento da área ardida por painéis fotovoltaicos? Ou por olival tradicional para a produção de azeite de alta qualidade, misturando a plantação com outras espécies igualmente tolerantes à falta de água: alfarrobeiras, figueiras, amendoeiras, loureiros e castanheiros. Mas a floresta também pode simplesmente alegrar a alma, criar sombra e ser um habitat diverso. É aqui que entram o sobreiro e o medronheiro. Ao fim e ao cabo, trata-se sempre da coexistência entre o Homem, os animais e a floresta, e de um aproveitamento sustentável e cuidado da natureza. As florestas são um ecossistema valiosíssimo para o nosso país. São parceiras fiéis e imprescindíveis, de incalculável valor, no entanto, encontram-se ameaçadas.

É por isso que a ECO123 irá questionar os candidatos às autárquicas acerca das medidas que propõem para travar os incêndios e para transformar a economia local, dependente de uma monocultura, diversificando-a. Quais são as suas ideias? Em causa está a salvação do meio ambiente em que vive a Humanidade. Os incêndios destroem o meio ambiente e são os maiores inimigos do clima e da atmosfera do nosso planeta. Segundo dados da FAO e da UNO, um quilómetro quadrado de floresta, quando queimada, emite 20.000 toneladas de CO2, tanto como 4.000 portugueses num ano (se considerarmos 5 toneladas por pessoa/ano). Em 2018, em Monchique, arderam 280 km2 de floresta, responsáveis pela emissão de 5,6 milhões de toneladas de CO2. E esse não foi o único incêndio esse ano. A ECO123 questiona os candidatos sobre esta questão-chave: qual é o seu plano político para a prevenção dos incêndios? O primeiro candidato chama-se José Chaparro. Tem 54 anos de idade e é candidato independente pelo CDS/PP.

Na semana que vem, apresentamos Bruno Estremores, do PSD. Todas as semanas um candidato de cada partido.

Subscreva e oiça o nosso podcast sobre este tema. Juntos, será possível melhorar o mundo em que vivemos. Ainda estamos a tempo. Caso tenha ideias concretas sobre como travar os incêndios e quais podem ser os primeiros passos nesse sentido, entre em contacto connosco via email (editor@eco123.info), apresentando as suas propostas. Iremos publicá-las e discuti-las aqui, antes das eleições de 26 de setembro. Não faça parte do problema, torne-se parte da solução.

Segunda Parte: Continue a ler e ouvir (Podcast) a entrevista com José Chaparro.

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José Chaparro, 54 anos, candidato independente à presidência da Câmara Municipal de Monchique pelo CDS-PP. Engenheiro de profissão, vereador com o pelouro das obras. Esta entrevista foi realizada na terça-feira, 10 de Agosto de 2021 no antigo restaurante Rouxinol, extinto pela força dos últimos incêndios em agosto de 2018.

 

 

 

ECO123: Que motivos o levaram a candidatar-se à presidência da Câmara Municipal de Monchique?

José Chaparro: Quem me motivou a ser presidente foi, em primeiro lugar, a população de Monchique. Antes de tomar a decisão de me candidatar, fui abordado por diversos quadrantes ideológico-políticos (inclusive por pessoas sem filiação), que me desafiaram para que tomasse a decisão. Sou de Monchique e tenho uma experiência, quer a nível profissional, quer autárquico: exerci funções como vereador independente, em permanência, pelo PSD em Monchique e estive quatro anos na Câmara de Lisboa.

Baseando-se nesta experiência de quatro anos e atendendo ao seu programa, o que pensa concretizar, caso seja eleito?

Nesta fase tenho toda a minha equipa a trabalhar sobre o programa. Vamos concorrer a Monchique e às Juntas de Freguesia do Alferce e Marmelete e um programa, para ser devidamente bem feito, carece de algum tempo e de ideias. Contudo, posso adiantar as diretrizes gerais do programa. Na área do Ordenamento do Território, passa por fazer a revisão do Plano Diretor Municipal (PDM), ordenamento do território florestal e urbanístico, requalificação urbana, nomeadamente na Rua Serpa Pinto, a rua de entrada na nossa vila…

Que alterações propõe dentro do PDM? Tem alguma proposta para a floresta, um dos recursos mais importantes da economia monchiquense?

Neste momento não posso adiantar em profundidade como será o PDM, até porque já participei na elaboração de alguns. Monchique reveste-se da particularidade de ser uma área vastíssima a nível florestal e uma área urbana. Quando a equipa para o PDM (composta por equipa multidisciplinar de técnicos de variadas áreas, desde arquitetos a engenheiros, biólogos e agricultores), as coisas serão direcionadas e teremos o PDM desejado. Precisamos ainda de acrescentar que o PDM, de acordo com a legislação, já devia ter sido executado há mais de 12 anos. Tem-se andado a arrastar a decisão de fazer a sua revisão. Isto tem-se traduzido na falta de criação de postos de trabalho em Monchique, já se deveria ter criado um parque industrial… Permitiu-se que determinadas indústrias proliferassem pela floresta e temos hoje em dia como consequência cicatrizes na mancha florestal. Tudo terá que ser muito bem analisado por essa equipa pluridisciplinar.

Dentro desta vertente existe também um grande perigo: os incêndios. Este tem aliás sido um dos sítios onde, nos últimos anos, os incêndios lavraram muita floresta, habitações… Que medidas pretende adotar para travar este problema?

Essa é uma questão muito profunda e que deve mover, não só os monchiquenses, mas também Portugal e, em suma, o mundo, porque é transversal ao planeta. Tenho especialistas nessa área na minha equipa e posso adiantar que as medidas passarão por reforçar a equipa da Proteção Civil…

… os Bombeiros…

Não só. Eles são uma peça chave porque conhecem melhor do que ninguém o seu território. Além disso, temos um Gabinete de Proteção Civil na Câmara Municipal, que tem que ser melhorado para que possa dar uma resposta mais rápida e eficaz sempre que houver o deflagrar de um incêndio. É na sua fase inicial que se evitam as grandes catástrofes. Sabemos o que aconteceu em 2018 e em 2021. Não atacado de início chega-se a um ponto em que se perde o domínio da situação.

Qual a sua segunda grande meta eleitoral?

Este ponto não é menos relevante que o primeiro. Falemos da natalidade e da demografia. Como fixar jovens em Monchique e criar emprego?

Como pretende fazê-lo?

Uma das medidas passa por avançar com o Parque Industrial, um projeto que já deveria ter sido iniciado há dez anos atrás. Essa decisão permitirá fixar empresas, quer do concelho, quer externas, porque as que possam ter sede fora de Monchique terão provavelmente alguns incentivos fiscais para se fixarem.

Outra das medidas passa pelos apoios sociais: a promoção do empreendedorismo, o apoio às instituições de solidariedade social, os mecanismos de apoio à população idosa, o apoio aos lesados nos incêndios e a melhoria do Gabinete de Apoio à Proteção Civil.

E em relação à saúde em Monchique… ao Hospital…?

O hospital é uma peça fundamental na nossa saúde em Monchique. Entristece-me – e sei de situações que se estão a passar com pessoas que deixaram de ter médico de família no nosso Centro de Saúde e foram obrigadas a recorrer a entidades privadas que cobram por vezes valores que as pessoas – nomeadamente a faixa etária mais idosa – tem muita dificuldade em pagar.

Primeiro há que melhorar o Centro de Saúde. A sua situação não é digna, precisa de pinturas, de reabilitação.

… e de mais médicos…

Primeiro há que tratar da infraestrutura e depois chamar os meios humanos que possam dar resposta à população. E isso passará por ter mais médicos, mais enfermeiros, todo o corpo necessário capaz de fazer face a uma população que decresceu em aproximadamente 500 pessoas, mas é uma população empobrecida e que precisa de apoios que serão contemplados no nosso programa.

Gostaria de voltar ao assunto dos recursos locais. Quais são, para si, os recursos de maior importância?

À semelhança do que se passa no privado, numa família ou numa autarquia, o mais precioso que podemos ter é o capital humano, e isso passa por dar condições aos trabalhadores, gerando motivação e satisfação entre as equipas.

E o que pensa do equilíbrio entre os elementos terra e água? Temos, a cada ano que passa, cada vez menos água e uma terra invadida por monoculturas. Que soluções?

Se nos circunscrevermos ao concelho de Monchique, nomeadamente ao relevo e às linhas de água de que dispomos, será uma possibilidade criar diques e barragens para conter as águas que são precipitadas sobre as nossas montanhas. Monchique tem um microclima: os ventos do oceano sobem a serra, batem na montanha e chove. Temos que reter essa água para que entre no nosso subsolo, aí reside o equilíbrio. Temos essas condições orográficas, precisamos construir infraestruturas para dispormos da água.

Cheguei a Monchique quando esta mancha de território era o pulmão verde de todo o Algarve e Baixo Alentejo. Era uma floresta muito diversificada e tinha apenas entre 25 a 30% de monoculturas de eucalipto. 31 anos mais tarde, são quase 80% de monoculturas de eucalipto e acácia e muito poucas culturas de castanheiro, sobreiro… Isso não é preocupante para si?

É muito preocupante. Desde pequenino habituei-me a ir com os meus pais e os meus avós para a floresta, a brincar na mesma. Sou da mesma opinião. Há 30, 40 anos, a nossa floresta tinha uma biodiversidade completamente diferente. Havia um equilíbrio que foi sendo interrompido pela senda dos incêndios. E isso trouxe espécies invasoras e nefastas. E hoje temos situações, como por exemplo, nas Caldas de Monchique, onde se prevê que dentro de dez anos venhamos a ter um matagal de acácias de difícil resolução. São situações que são autênticos barris de pólvora.

Quer fazer um balanço destes quatro anos como vereador? Por que motivo foi “despedido” pela atual presidência de Rui André?

Vejo que está bem informado. Há três horas, quando terminou a reunião de Câmara, fui confrontado com essa situação. Foi caricato, porque faz parte do processo democrático – e da legislação – que, sempre que o presidente leve propostas a sessão de câmara, deva, com a antecedência devida, informar todos os vereadores. E o senhor presidente não informou. Quando a sessão estava a terminar, apresentou uma proposta, do desconhecimento da vereação – e exonerou-me, ou seja, “despediu-me”.

Após três mandatos em Monchique, Rui André candidata-se agora pelo PSD ao concelho de Portimão. Talvez daqui a seis semanas tenhamos um novo presidente que se chama José Chaparro. Que ideias pretende realçar nessa nova função?

O nosso programa contempla ainda a reabilitação das escolas de Monchique, da Manuel Nascimento, da escola de Marmelete e da escola dos Casais. Pretendemos ainda melhorar e aumentar os recursos humanos das escolas, porque a melhor coisa que podemos ter é o capital humano.

E em relação à saúde das crianças que frequentam as escolas? Todas têm ainda telhados de amianto. Tem isso em conta?

O fibrocimento tem, na sua composição, amianto, um produto altamente cancerígeno. Isso é sabido. Dentro das minhas funções, dos meus pelouros, ao longo destes quatro anos, tomei a iniciativa de retirar do edifício com maiores áreas – os armazéns municipais – a cobertura de fibrocimento. Mas a câmara já deveria, há anos, de acordo com a legislação, ter tomado a iniciativa de o retirar nos restantes edifícios. A Escola Manuel Nascimento, por exemplo, e a de Marmelete, estão totalmente cobertas com fibrocimento.

Mas as crianças, os jovens, não deveriam estar em primeiro lugar? Eles são o nosso futuro. Por que não começar com as escolas? Se a população de Monchique votar José Chaparro, nos próximos quatro anos as escolas poderão ver-se livres do amianto?

Fará parte do nosso programa, sim. Ao nível da Escola Manuel Nascimento, fui o responsável pela sua reabilitação e ampliação. Foi mesmo lançada uma empreitada para que o fibrocimento fosse retirado exclusivamente no Bloco C. Estranhamente, o concurso ficou deserto – ou parece que há um problema jurídico – são coisas que fogem à minha alçada. Tenho acima de mim um presidente que se chama Rui André, e a senhora vereadora, que se chama Arminda Andrés, que têm o pelouro monetário. E eu não posso fazer nada se este setor não for desbloqueado.

E o mesmo se passa com a escola de Marmelete. Está degradante, pode colocar em risco a saúde e segurança das crianças – com vãos deteriorados, frio e chuva que entram pelo edifício, armaduras à vista nos pilares, uma cobertura de amianto – e durante os 12 anos de presidência de Rui André nada foi feito a este respeito.

Onde se encontra este assunto no seu programa, por ordem de importância?

É um dos que irá em primeiro, com certeza. Privilegiar tudo o que é a preservação da saúde e da integridade das pessoas.

Gostaria ainda de realçar alguns aspetos?

Sim. Ao nível das infraestruturas, temos que rapidamente colocar em funcionamento o Estacionamento de São Sebastião. Estará em primeiro lugar no nosso programa.

… para ganhar dinheiro todos os dias …

Afirmativo. A Câmara precisa de receitas. Não pode ter mais de 30 carros ilegais dentro do Parque de S. Sebastião. Neste momento, o parque está selado, e nada se passa.

O outro ponto que se reveste de grande importância é a Serração, uma das obras icónicas do nosso programa.

Está a falar da Casa do Povo de Monchique e da cultura no concelho…

Exatamente. A Casa do Povo será para reabilitar e devolver à população. Mas queremos também pegar na Serração – na zona onde funcionava o antigo parque de madeiras e a zona de laboração das máquinas – e transformar num parque multiusos, onde se possam realizar eventos culturas, desportivos, feiras… Pretendemos dotar toda a parte restante de um museu, no qual tenho vindo a trabalhar nos últimos anos.

E, para fechar, gostaria de referir que em Marmelete pretendemos concluir a piscina, cuja obra já deveria ter avançado; proceder à construção do bairro de habitação a custos controlados; melhorar toda a área envolvente (arranjo paisagístico); e criar um parque de autocaravanas.

Na freguesia do Alferce, temos a questão do Castelo, que continuará a ser explorado em termos arqueológicos. Estamos a falar num projeto a 15, 20 anos. E, por outro lado, queremos implementar em Monchique diversos passadiços. O passadiço do Barranco do Demo, no Alferce, será um dos ex-libris deste projeto.

No futuro será possível a um cidadão de Monchique assistir a eventos culturais no concelho?

Essa é a nossa intensão. A nossa ambição passa também por, no espaço temporal de dez anos, aumentar entre 30 a 60% a população de Monchique. Tenho consciência do valor deste território, ele é um diamante por lapidar. E é bem provável que, uma vez criados os atrativos, pessoas de Portimão ou de outros locais queiram mudar-se para Monchique.

 

Uwe Heitkamp (60)

jornalista de televisão formado, autor de livros e botânico por hobby, pai de dois filhos adultos, conhece Portugal há 30 anos, fundador da ECO123.
Traduções: Dina Adão, Tim Coombs, João Medronho, Kathleen Becker
Fotos: dpa

 

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